Caros leitores, como alguns já sabem, faço parte daqueles que, de vez em quando, tem uma cólica renal. Quem já teve sabe da dor que estou falando, quem não teve, por favor, nem tente entender e muito menos julgar ou achar que é frescura, mas não quero ficar falando em sofrimento ou dor, ao contrário, pretendo abordar aqui de uma forma cômica todo o sofrimento da minha última crise, pois agora que já passou mesmo, dá até para brincar com a situação e nada melhor do que rir. Antes que venham os chatos comentar, sim, claro, estou exagerando na figura de linguagem, pois foi a forma que achei para tornar o trágico um pouco mais engraçado, então, poupem os comentários chatos e desnecessários. Se preferir, tenha sua própria cólica e depois conte do seu jeito, ok?
O início dessa saga aconteceu mais ou menos no mês de junho de 2014, quando tive uma dor muito forte e, por já saber como são as dores de uma cólica, não tive dúvidas de que lá vinha mais uma. Procurei um urologista, que me passou os remédios de praxe e pediu uma tomografia para poder ter uma visão melhor da situação.
Minhas cólicas são regulares, costumo até pensar que disciplinadas, pois ocorrem normalmente a cada dois anos e lá se vão uns quinze anos desde a minha primeira crise, quando acordei no meio da madrugada achando que estava morrendo, pois estava com uma dor de faltar o ar, não conseguia ficar ereto e a minha região genital parecia que estava explodindo. Achei que meu fim estava próximo, que o chamado estava chegando e já comecei até a ver as luzes que todo mundo fala que vê quando está morrendo. Me arrastando fui até o posto médico, que ficava a menos de 500 metros da minha casa. O médico examinou, examinou e falou com toda naturalidade que era só uma cólica renal.
Só??? O que ele queria? Me passou analgésico e fiquei em observação por um tempo. Me senti no filme exorcista, como protagonista, é claro, pois já estava subindo pelas paredes, virando a cabeça em 360º e falando alguma língua que nem eu conhecia. Enfim, alguns dias ainda se passaram e saiu a causa da minha dor: uma pedrinha minúscula, mas cheia de pontas, que parecia um porco espinho. Claro que para sair ela fez questão de tapete vermelho, com todas as pompas e honras. Fiquei lembrando da desgraçada por vários dias, principalmente quando ia fazer o número um (vulgo mijão).
De lá para cá, isso se repete regularmente, mas para minha alegria já haviam se passado quatro anos da minha última crise e eu, otimista que sou, inocentemente achei que poderia ter me livrado desse mal, mas….. não foi bem isso que a tomografia mostrou. Na verdade, a bonitinha, ficou repousando, tal qual um porco de granja, apenas engordando e ao contrário de todas as demais, que eram minúsculas, essa parecia um asteroide e tinha 1 cm. Verdade seja dita, era bonitinha, redondinha, bem criada mesmo, mas voltando, lá estava eu com o laudo nas mãos e uma cara já de pavor, pois tinha uma pedra em cada rim, sendo que a do rim direito era esse asteroide de 1 cm e, do lado esquerdo, um pequeno fragmento estelar de 0,5 cm.
As notícias foram bem animadoras e diretas: devido ao tamanho do asteroide, ela não sairia naturalmente, pois segundo as informações que o médico me passou, o máximo que a uretra consegue expelir “naturalmente” é um cálculo de 5mm. Conclusão, pelo menos a do lado direito eu teria que fazer um procedimento para tirar, já a outra, sairia “naturalmente”. O desgraçado parece que se realizava com a palavra naturalmente e eu já estava xingando a sua décima geração, pois esse natural seria mais ou menos como um parto de trigêmeos, mas todos nascendo ao mesmo tempo.
Em meio a tudo isso eu estava mudando de cidade, mas felizmente a cólica passou e acabei deixando um pouco isso de lado. Assim que me organizei na cidade para a qual me mudei, procurei outro urologista, pois no fundo, ainda tinha esperança de ouvir uma sentença um pouco melhor. Cheguei logo falando que tinha uma pedrinha no rim e o médico olhando o exame falou a frase que sentenciava meu destino: “pedrinha, você tem é um tijolo ai”. Após comentário motivador, creio que o cidadão faz cursos de motivação, pois sabe como estimular seus pacientes, não tive dúvidas de que não teria outro caminho.
Começo então a me informar sobre como seria esse procedimento e fui tranquilizado, pois a cirurgia não tinha corte, era “somente um aparelho, que lembrava um endoscópio, que seria introduzido pela minha uretra, chegaria até a pedra, trituraria e pronto, os fragmentos seriam expelidos naturalmente”. Como tinha feito uma endoscopia há pouco tempo fiquei logo imaginando essa endoscopia uretral e confesso que novamente vi as luzes do fim da vida. Acho que prefiro o corte, pode ser?
Em meio a burocracias e demoras da clínica, acabei indo parar em outro médico, numa clínica especializada no assunto, com diversos e respeitados especialistas no assunto. Lá vem a maldita pontinha de esperança novamente, mas durou pouco, na primeira consulta o médico já queria que eu ficasse por lá mesmo para fazer o procedimento.
Ei, calma ai, não é assim, preciso de um tempo para me preparar psicologicamente, pensa que é assim, três ou quatro meses não foram suficientes, preciso de mais tempo. Marquei para a outra semana.
O procedimento novamente foi explicado, em detalhes, mas com muita tranquilidade, eu colocaria um cateter entre o rim e a bexiga, quer serviria para duas coisas: aliviar a dor e o desconforto que eu sentia e também para alargar o canal da uretra, para facilitar a passagem do aparelho durante a cirurgia. Um frio polar tomou conta da minha medula espinhal, pois eu ficaria com um tubo que iria me arrombar para outro tubo maior. Desisti de maiores perguntas e me conformei que o fim realmente estava próximo.
Segunda-feira, oito horas da manhã, jejum absoluto, lá estou eu na recepção do hospital para internar e fazer o tal procedimento. Chego no quarto e logo após a enfermeira já veio com aqueles roupões característicos de centro cirúrgicos, pediu para eu tirar toda a roupa e só ficar com ele, que logo eles já me levariam. Nesse ponto, você já foi longe de mais para voltar atrás e quer que a coisa termine logo, portanto, que seja feito logo. Ela bate na porta, entra com a maca e disse sorrindo: “vamos, já chamaram”. Aquele sorrisinho me dava vontade de morrer. Enquanto estou descendo pelos corredores do hospital, que deveria ter uns 400 km, porque não acabava nunca e eu já havia rezado para tudo que é santo, chego numa grande porta, ela toca a campainha e outra enfermeira, toda paramentada, vem me receber. Procedimentos de praxe, e lá vou eu para dentro da sala de pré anestésico, fiquei por lá uns vinte minutos, mas pareceu que foram uns dois dias e ai vem outra enfermeira, se apresentou, claro que não faço a menor ideia do nome dela, pois acho que nem do meu eu lembraria nesse momento e me disse que me acompanharia durante todo o procedimento, me fez umas perguntas que não entendi nada, do tipo, você sabe qual médico vai te operar? Claro que sei, como esquecer aquele sorriso de psicopata masoquista, me tranquilizando e dizendo que não doeria nada, que eu somente iria sentir um desconforto leve e que sentiria mais vontade de fazer xixi, mas só isso.
Chego no centro cirúrgico, achei melhor já ter sido anestesiado no quarto, mas enfim, vi tudo. O anestesista, todo sorridente me deu bom dia, se apresentou, sei lá se era Dr. Valdir, Dr. Antonio, Dr. Vespúcio, não faço ideia, mas fez mais algumas perguntas de praxe, alergias, etc e tal. Nisso, o enfermeiro que estava na sala já começou os preparativos para o procedimento e, por um momento, cheguei a achar que tinham chamado a pessoa errada, pois o meu não era um parto normal, era cálculo renal, mas assim foi, fiquei lá, naquela posição de parto, muito cômoda, mas a essa altura, resolvi que relaxar era a melhor alternativa, afinal, era inevitável mesmo.
“Sr. André, agora eu vou aplicar o anestésico, o senhor vai sentir uma leve tontura e……………”, acordei uma hora depois na sala de recuperação. Me mexi, observei que tudo estava onde deveria estar, fato que me deu uma alivio, e fiquei lá, imóvel, com medo até de respirar. Uma das enfermeiras veio, falou comigo, fez mais algumas perguntas e disse que estava tudo bem, que eu ficaria ali por mais uma meia hora e já iria voltar para o quarto. Passado cerca de trinta minutos veio o médico que fez o procedimento, falou que tudo tinha corrido bem, que eu iria para o quarto e, caso eu urinasse normalmente, estava de alta às dezesseis horas. O sr vai tomar alguns remédios, caso tenha dor e, assim que o plano autorizar a cirurgia, fazemos o restante do procedimento. Me lembrei de outras situações e esse “caso sinta dor” dos médicos, pode ser, tranquilamente, interpretado como: “você vai sentir muita dor, esse remédio não vai ajudar praticamente porra nenhuma, mas é o que temos”. Desvio o pensamento, afinal, eu poderia estar sendo muito trágico.
Fiquei aliviado, nem estava sentindo nada, era simples assim? Senti o chamado novamente por nada? Agradeci ao médico e fiquei ali, aproveitando o tempo, ainda meio tonto devido a anestesia geral, enfim, curti o barato que só quem já tomou uma anestesia sabe como é.
“Sr. André, já chamei a equipe da internação e o senhor já vai para o quarto”. Ufa, pensei, que bom. Lá vou eu pelo corredor, que agora parece que tinha só uns 2 quilômetros. Chego no quarto, minha esposa já estava lá e foi a coisa mais linda que vi. A enfermeira me ajudou a ir para cama e já foi logo avisando que eu não poderia me levantar. Tudo bem, pensei, é normal, mas a bexiga começou a encher, fiquei feliz, pois lembrei que a condição para ter alta era urinar normalmente. A enfermeira trouxe o propício recipiente para que eu pudesse, mesmo deitado, aliviar a pressão da bexiga. Posição tomada e lá vai. Não senti a urina saindo, senti toda a força de uma erupção vulcânica saindo das minhas entranhas e juro, achei que o tal recipiente tinha derretido, pois a sensação era de que lavas vulcânicas estavam saindo e não um simples e inocente xixizinho. Nesse momento tudo ficou claro, a preocupação com que eu fizesse xixi, tudo fez sentido, afinal, se eu sobrevivesse ao primeiro xixi, haveria chance para o restante.
Apesar das lavas vulcânicas, não sentia dores na bexiga ou rim e isso era bom e tive alta. Fui para casa achando que tudo ficaria tranquilo. Na viagem, aqueles buracos no asfalto, que já estamos acostumados, tomaram status de fossas tectônicas, parecia que o carro caia num abismo e voltava. Cheguei e deitei e uma dorzinha incomodou na bexiga e no rim, quando fui fazer meu inocente xixizinho. Penso, deve ser pela viagem, vou ficar quieto que isso passa. Como sou inocente. A cada xixizinho a dor aumentava, pois acredito, todo o efeito anestésico já havia passado, portanto, a companheira dor chegou em todo seu esplendor e força.
Veja a sequência da desgraça:
A saga de uma cólica renal – o retorno
A saga de uma cólica renal – o grand finale
A saga de uma cólica renal – Eu sei o que vocês fizeram na cirurgia passada (Nova temporada)