O Terceiro Encontro – Política
Era uma tarde muito agradável, como a grande maioria delas, a temperatura estava em torno de 20ºC, uma brisa suave dava uma sensação de completo bem estar. Os canteiros de flores deixavam o campo ainda mais bonito, eram canteiros imensos, com flores de todos os tipos e formas, a grama muito bem aparada por todo o lugar dava a impressão de ser um grande tapete verde, as árvores, com suas copas majestosas, proporcionavam grandes áreas de sombra, e, praticamente em todas elas, no seu tronco, haviam confortáveis bancos, onde qualquer pessoa podia se sentar e desfrutar de horas de profunda reflexão e relaxamento.
Era próximo das 16 horas quando Vitor chegou, escolheu uma árvore e se sentou para aguardar seu nonno, que chegou aproximadamente 15 minutos após. Nesse tempo, Vitor apreciou a natureza, sentiu suas energias renovadas e refletiu um pouco sobre sua vida e os planos que tinha para o futuro.
Assim que viu Orlando chegando, correu ao seu encontro, abraçou-o e sentaram-se para o primeiro de alguns encontros que viriam pela frente, pois esse assunto não se esgotaria tão rápido, tendo em vista que era um dos fatores que mais marcou a humanidade e, através do qual, vários outros pontos se interligavam, sendo um dos principais responsáveis pelos sofrimentos da humanidade. Orlando sabia que teriam muito a conversar, Vitor, por sua vez, aguardava os ensinamentos que viriam, sabia que seriam conversas longas e estava preparado para entender mais esse lado sombrio da história humana.
– Vitor, para começar nossa conversa, vamos abordar um pouco as origens e definições da política e, talvez, uma das mais corretas definições do que é a política, foi dada por Aristóteles, um grande pensador, que viveu de 384 A.C. até 322 A.C., que a definiu de uma forma bastante sábia. Dizia Aristóteles que a política era essencialmente unida à moral, porque o resultado final do Estado era a virtude, a formação moral dos cidadãos e o conjunto de meios necessários para isso. Ainda segundo Aristóteles, o Estado era superior ao indivíduo, já que o coletivo era sempre superior ao individual e o bem coletivo sempre superior ao bem individual. Essa definição, dada bem nos primórdios da humanidade, demorou milênios para ser entendida e, por muitos anos, o homem não fez nada do que era a verdadeira política, interpretando-a de forma complemente errada, gerando consequências desastrosas ao interesse comum, sempre em detrimento ao interesse particular ou de um grupo muito reduzido de pessoas.
A história humana é repleta de exemplos negativos sobre a interpretação da política, desde os mais primórdios até por volta do ano 2250, quando a humanidade, saturada de todos os descontroles e situações humilhantes a que estavam subordinados, resolveram agir e mudar, mas, veja meu neto, foram quase três milênios, isso considerando somente a era cristã, para que algo fosse modificado. De tempos em tempos surgiam pessoas que influenciavam as opiniões e tentavam abrir os olhos das multidões, mas, com frequência, elas eram colocadas à margem do sistema, as pessoas, influenciadas por todo um sistema altamente corrupto, massificante e alienador, não lhes davam atenção e elas eram rapidamente esquecidas, ou, quando conseguiam deixar seus registros, estes eram estudados e analisados por pouquíssimas pessoas, a maior parte da população mundial não se importava muito com o que acontecia, achava que nada poderia ser feito, então, deixavam que as coisas fossem acontecendo.
– Nonno, sei que já falei isso quando discutíamos a religião, mas como pode o homem não se importar com o que lhe acontece? Como pode ele deixar nas mãos dos outros as decisões sobre a sua própria vida? Que tipo de pessoa não se importa com decisões que vão lhe afetar diretamente?
– Vitor, esse eram nossos ancestrais, seres humanos extremamente relapsos, sem o mínimo de senso crítico, dotados de uma inteligência muito rudimentar, que não tinham conhecimentos suficientes para perceber essas manobras. Infelizmente, alguns políticos da época tinham essa consciência, sabiam do poder que tinham, mas como não tinham moral, utilizavam essa influência e poder de forma muito negativa, para dominar ao invés de governar, pois estes são conceitos muito diferentes. Nossos ancestrais eram dominados, domesticados, tal qual ratos de laboratório, ganhando pequenas recompensas por seus trabalhos, mas sem ter a menor consciência de que podiam muito mais, de que eram merecedores de recompensas muito maiores, mas como não tinham essa consciência, esses benefícios ficavam nas mãos de poucos.
– O sistema político da época era totalmente falido e desprovido de qualquer intenção verdadeira sobre o bem estar amplo, os políticos somente queriam seu próprio bem estar. A política era entendida apenas como um mero jogo de interesses, jogo esse que beirava a insanidade e o completo absurdo, onde tudo era permitido, desde que alguém levasse alguma vantagem. Governantes faziam de conta que não sabiam, juízes legislavam em causa própria, senadores e deputados somente discutiam seus próprios interesses e o povo, ah o povo, esse somente pagava a conta, com cargas tributárias altíssimas, serviços públicos de péssima qualidade, como por exemplo, a saúde, a educação e a segurança, que são princípios básicos de dignidade de qualquer ser humano, mas que não eram respeitados. O povo pagava caro, muito caro, mas não tinha nada e todo o dinheiro era empregado em benefício de políticos corruptos, sem moral, que exploravam e subtraiam bens valiosos ao interesse geral.
– Meu neto, o maior problema dos nossos antepassados era a educação, ou melhor dizendo, a falta dela. As pessoas, na sua grande maioria, não estavam preparadas, não tinham conhecimentos suficientes, pois somente uma pessoa que pensa, que critica com base em fundamentos sólidos pode promover qualquer tipo de mudança. O processo de educação, como hoje temos, não era conhecido na época, as pessoas nem de longe eram estimuladas a pensar, a criar, apenas repetiam conteúdos desconexos, estudos que na maior parte das vezes não serviam para nada, mas essa era exatamente a intenção, ocupar os pensamentos com coisas sem importância, com conhecimentos que não serviriam para iluminar as mentes das pessoas, que apenas lhes deixariam distraídas e mergulhadas em ideias vagas e desprovidas de lógica e bom senso. Nesse ponto, os políticos, as mídias e as instituições de ensino deram uma valiosa contribuição no sentido de retardar o crescimento e a evolução das pessoas.
– Mas esse não era exatamente o oposto do que deveriam fazer, nonno?
– Sim, teoricamente sim, no entanto, meu neto, a podridão que imperava era algo impensável, a falta de caráter, de honestidade era tão grande que os valores estavam completamente invertidos, todo o sistema estava tão corrompido que os poucos que se arriscavam a fazer o que deveria ser feito, logo eram eliminados, de uma forma ou de outra, mas eram sumariamente excluídos do sistema. Vamos começar a entender como as coisas funcionavam nessa época e uma forma de começarmos essa nossa conversa é entendendo o papel da educação. Como você me definiria, meu neto, o papel da educação?
– Bom, nonno, eu entendo a educação como um processo de aprendizado contínuo e também libertador, pois a medida que o conhecimento é adquirido, isso gera mudanças profundas na forma como pensamos e agimos, nosso campo de visão aumenta, deixamos de acreditar em coisas que não tenham sentido e explicação racional. A educação, pelo menos ao meu ponto de vista, sempre deve ser entendida como algo que estimule as pessoas a pensar, a questionar seus valores, a rever conceitos, ou seja, como falei, algo que liberte a mente e promova o crescimento moral e intelectual.
– Muito bom, Vitor, o papel da educação é esse mesmo, esclarecer as pessoas, fazê-las pensar, questionar, criticar e, com isso, promover mudanças, mas isso é facilmente entendido agora, com nosso atual sistema político, mas antigamente isso não era esperado, não era desejado e não era de forma alguma colocado em prática, tanto pelos governos quanto pelas instituições de ensino, que na sua grande maioria, estavam vendidas a um sistema corrupto de jogos de interesses políticos.
– As instituições de ensino, desde o fundamental, da alfabetização até o ensino superior, eram extremamente manipuladoras e massificadoras. O conhecimento, dentro de todos os níveis, era o menos importante, segundo a política vigente na época, uma vez que pessoas pensando não eram interessante e, se as pessoas começassem a pensar e a questionar, começariam a ver o que acontecia de errado no próprio governo, na forma como os políticos exerciam seus mandatos de forma descompromissada, irresponsável, legislando somente em prol dos seus próprios interesses. Se as pessoas começassem a se esclarecer e a pensar, não seria mais possível disseminar todo tipo de informação manipulada pela mídia, que também era outra ferramenta poderosa e extremamente manipuladora, se pensassem as pessoas deixariam de acreditar cegamente, passariam a cobrar explicações, não aceitariam as informações mentirosas e manipuladas, portanto, agora fica fácil entender porque a educação não era vista com seriedade pelos governos, de uma forma geral e isso não era limitado a um único país não, todos manipulavam seus governados, uns mais, outros menos, mas o processo era o mesmo, as pessoas viviam sob uma falsa autonomia, sob uma falsa liberdade e, na grande maioria, somente tinham por base as informações transmitidas pelos meios manipuladores.
– O poder manipulador do governo era tão grande e tão amplo, que muitos não faziam sequer ideia de tudo o que acontecia, mas podemos dizer que nada, absolutamente nada escapava aos interesses escusos de políticos corruptos e de uma máquina governamental que esmagava qualquer tentativa de trazer à luz as pessoas. Os grandes centros de pesquisas acadêmicos eram compostos por pessoas ligadas ao governo, mantidas pelas verbas públicas, portanto, altamente suspeitos e manipulados. As pesquisas e estudos divulgados, na sua grande maioria, eram encomendados pelo próprio governo, pois quando ele precisava tirar o foco de alguma situação ou gerar novas fontes de renda, alguns dados “novos e importantes” eram revelados através de estudos científicos. Vamos tomar como exemplo a área da saúde, que em tese era uma obrigação do Estado, mas que também era relegada. Uma das empresas mais lucrativas, senão a mais lucrativa da época eram as indústrias farmacêuticas, que criavam medicamentos para combater males que afetavam as vidas das pessoas.
– Nonno, mas isso não era bom? Se as pessoas estavam doentes, não era importante combater a doença?
– Sim, era sim, mas o problema era que a indústria farmacêutica era uma grande aliada dos governos, lucravam muito com as doenças e isso gerava uma fortaleza impenetrável. Laboratórios manipulavam estudos, dados de pesquisas, criavam novas doenças, como vírus, por exemplo, que infectavam milhares de pessoas pelo mundo e tudo isso para fazer com que a máquina funcionasse. Eles alegavam que precisam de incentivos públicos para as pesquisas e então, os governos do mundo todo, liberavam verbas gigantes para combater a doença, que já havia sido programada e, mesmo a cura, já estava pronta, mas ainda assim, eles permitiam que muitas pessoas morressem ao redor do mundo, para espalhar o medo e incutir nas pessoas a necessidade de consumir o poderoso antídoto que eles estavam criando, que era a única forma de cura e proteção. As pessoas, com medo de morrer, corriam para comprar os medicamentos, a preços altíssimos. Em outras situações, o governo, se fazendo de politicamente correto e passando a imagem de cuidar das pessoas, subsidiava os custos com os medicamentos e distribuía a população, que ficava eternamente grata aos seus governantes, acreditavam que eles estavam cuidando da sua saúde, mas a verdade era bem diferente, eles estavam apenas visando os lucros estratosféricos gerados pelos laboratórios, que repassavam, em forma de propinas, muito dinheiro a deputados, senadores, juízes, enfim, a pessoas do poder público com alta influência e poder de decisão. E foi dessa forma que a indústria farmacêutica sobreviveu por muitos séculos, sempre manipulando informações, criando doenças para depois poder “curá-las”.
– Esse, meu neto, foi apenas um exemplo, mas essa prática escusa era aplicada a praticamente todas as grandes empresas, que sempre estavam envolvidas em escândalos de corrupção, mas como o poder era muito centralizado, a certeza da impunidade era muito grande e, de fato, era isso que acontecia. Para não dizer que nada era feito, a mídia, que já havia combinado tudo previamente, divulgava algumas informações, normalmente as mais abstratas e irrelevantes, fazia algum tipo de alvoroço, para dizer que estava cumprindo seu papel de informar, mas estava longe disso, já que as verdadeiras informações nunca chegavam ao público em geral. O povo, por sua vez, sempre muito pacífico e altamente manipulável, aceitava as justificativas, até acreditava que as coisas estavam mudando, mas logo se esqueciam e tudo ficava por isso mesmo, ninguém era punido e todo o esquema continuava da mesma forma. De vez em quando, para não despertar muitas suspeitas, alguém era punido, se é que assim se pode chamar, uma vez que as punições pareciam mais benefícios do que castigos. Era feito todo um processo de alarde na mídia e alguém era preso, mas alguns dias após, tudo já estava resolvido, as prisões já eram combinadas e os poucos que realmente eram punidos, normalmente eram pessoas que, por algum motivo, deixaram de fazer parte do sistema corrupto e, para que eles não falassem mais nada, eram presos de fato, isolados pela mídia ou, como aconteceu em vários casos, eram mortos em situações altamente suspeitas, mas que nunca eram investigadas a fundo e nunca nenhum culpado era identificado.
– Mas vamos voltar a falar das instituições de ensino, afinal, esse era nosso foco agora, mas foi importante essa contextualização para que você possa compreender melhor ainda o que vamos falar agora.
– Como você já deve ter notado, o poder de reação das pessoas era muito baixo em alguns países, praticamente nulo e, em grande parte, essa situação deveria ser de responsabilidade daqueles que tinham a obrigação de promover o conhecimento. Para exemplificar, vamos tomar por base o Brasil, que era um dos países bastante atrasado no assunto educação, porém, como já falei, não era somente lá que essas coisas aconteciam, mas vamos usá-lo para facilitar nossa conversa e entendimento.
– Por muitos anos, mas muitos mesmos, a educação nesse país sempre foi algo que não mereceu nenhuma atenção e respeito por parte dos políticos e governantes e eles tinham inúmeras estratégias para mascarar isso, como por exemplo, pesquisas, relatórios que comprovavam a facilidade do acesso à educação, regras e políticas de financiamento estudantil, entre muitos outros fatores, que eram usados como bandeiras por muitos partidos políticos, mas a realidade era bastante diferente e distante disso. O sistema educacional do país era tão frágil que permitia que estudantes saíssem do ensino superior sem qualquer conhecimento verdadeiro, e em casos extremos, praticamente sem saber escrever. Não digo a escrita rudimentar, mas a escrita lógica, que realmente expressa as ideias, que não era comum, as pessoas mal se entendiam, não tinham o conhecimento necessário para produzir um texto comum, uma vez que não conseguiam ordenar seus pensamentos e ideias de forma lógica. Por mais cruel que possa parecer, esse era exatamente o objetivo da política da época, uma vez que, pessoas com esse nível de compreensão e entendimento, eram manipuladas de uma forma muito fácil, sem muito esforço, já que não tinham as aptidões necessárias para poder ter um senso crítico sobre uma situação, portanto, deixavam com que os outros decidissem por elas e, talvez agora, mais uma vez, sua pergunta seja respondida, meu neto. Era por isso que as pessoas deixavam que outros decidissem por elas, pois elas sequer tinham noção de que isso acontecia, achavam que era normal, e a vida toda, desde que entraram na escola, já eram manipulados para isso. Os métodos de ensino eram retrógrados, os alunos não eram estimulados a entender nada, não tinham que se preocupar em construir novos conhecimentos, bastava ficar repetindo mecanicamente o que outros já haviam estudado, estudo esse que, como já falei, na grande maioria não servia para muita coisa além de alienar cada vez mais as pessoas.
– Por um bom tempo o acesso ao ensino superior foi muito restrito, praticamente voltado a uma elite que servia aos interesses de poucos, normalmente aos clãs mais poderosos, mas essa situação não perdurou por muito tempo, primeiramente porque o governo precisava passar a imagem de bom governo, a imagem de que estava preocupado com a qualidade de ensino e com a qualidade de vida das pessoas e, mais importante que tudo isso, porque ele percebeu que a educação, desde que bastante manipulada, seria uma nova ótima fonte de renda, tais quais as indústrias farmacêuticas, talvez até mais poderosas e, sob o pretexto de promover o conhecimento e a igualdade, essa educação seria estendida a todos. O processo de alienação coletiva então começou a ser colocado em prática, sendo que um dos mais conhecidos foi o da aprovação continuada, ou seja, ainda que o aluno não tivesse aprendido nada, ele seria automaticamente aprovado. Para justificar tamanho absurdo, inúmeras explicações foram dadas e o povo, que já vinha de um processo de alienação natural há muito tempo, foi aceitando. O resultado desse processo foi catastrófico, do ponto de vista educacional, mas um completo sucesso, do ponto de vista do governo, pois o aluno completava todo o ciclo inicial do processo de aprendizado e não sabia nada. Esse processo se estendeu por algumas décadas e foi gerando uma demanda reprimida de acesso ao ensino superior, tendo em vista que esses alunos não conseguiam entrar nas universidades públicas, que continuavam elitistas.
– O processo caminhava muito bem, havia uma boa demanda de alunos, teoricamente, aptos ao ensino superior, era chegado o momento de colocar a outra parte do plano em ação. Novamente, muito bem maquiado por uma política de inclusão social e elevação do nível intelectual e social das pessoas, o governo criou programas e linhas de financiamentos estudantis, com condições que permitiriam que todos tivessem o acesso a tão sonhada formação superior. Muitas faculdades já haviam sido criadas para esse fim e o processo envolveu anos de negociações. Essas faculdades e universidades passaram a ofertar ensino de uma forma democratizada, diminuindo o abismo social que imperava, elas não vendiam cursos, vendiam sonhos, vendiam qualidade de vida, vendiam um futuro melhor e, como faz parte do processo natural do ser humano, todos sonham com uma vida melhor e mais tranquila e esse foi o início de uma das maiores indústrias que o planeta já teve, a indústria da educação.
– Os governos, com suas políticas escusas e manipuladoras, primeiro criaram uma necessidade e, logo depois, já estavam propondo a solução, sendo que tudo isso já fazia parte de um projeto elaborado e arquitetado por várias décadas, mas podemos dizer que foi um projeto que funcionou muito bem, por muitos anos e gerou infindáveis recursos financeiros aos donos das instituições de ensino e também ao governo, já que havia muito suborno e muita divisão dos recursos. O governo emprestava o dinheiro para o estudante bancar seus estudos e esse dinheiro era creditado diretamente para a instituição de ensino, que recebia o montante sem nenhum esforço. Esse valor, após recebido, em partes voltava ao próprio governo, na forma dos subornos acima citados, dos fortes esquemas de corrupção que imperavam de forma generalizada. Após o estudante concluir seus estudos, ele começava a pagar esse financiamento, mas sempre na esperança de já ter um futuro melhor, afinal, já estaria formado, ganharia mais, mas isso não correspondia a realidade, ele até poderia estar formado, mas sem muitas qualificações técnicas, já que isso não era interesse do próprio governo, que já havia combinado isso com as instituições. O mesmo processo do ensino fundamental, se repetiria no ensino superior e, novamente falando, pessoas pensando e com senso crítico não eram interessantes, já que uma das primeiras consequências, seria a derrubada do próprio sistema de ensino, que visava somente lucro. Esses estudantes, agora já formados, entravam para o mercado de trabalho, mas estavam longe de conquistar os propósitos almejados e, de uma hora para outra, se viam com uma dívida imensa para pagar e sem nada daquilo que lhes foi prometido.
– Nesse ponto, tanto o governo quanto a instituição o abandonavam e o relegavam a sua própria sorte. Também lhe era incutida a ideia que se algo não desse certo, era tão somente porque ele não havia se esforçado o suficiente, portanto, a instituição estava isenta. O governo simplesmente havia cedido um empréstimo e agora queria o retorno, cobrando impiedosamente o valor, com juros, correções e, em muitos casos, executando judicialmente esses estudantes, tomando-lhes os poucos bens que eles tinham. Conclusão de todo o processo: as pessoas continuavam na mesma e ainda corriam o risco de perder o pouco que tinham, caso não conseguissem pagar seu empréstimo.
– Em meio a todo esse processo massificador, escuso, sujo e sórdido, alguns se salvavam e conseguiam uma situação melhor. Estes então eram usados como exemplos aos demais, na mesma tentativa de incutir em cada um o sentimento de culpa caso algo não desse certo, quando na verdade, pelo próprio contexto e planejamento, tudo já era feito para que houvessem chances mínimas de sucesso.
– Nonno, estou sem palavras, pois jamais imaginei que algo tão benéfico e construtivo como a educação já tivesse sido usada de forma tão vil pelos homens. Isso é repulsivo, revoltante!
– É sim, Vitor, mas infelizmente essa foi uma prática adotada em quase todos os países, por muitos e muitos anos e com ela, muitas fortunas foram geradas de forma escusa e corrupta.
– Os governos, de forma geral, faziam muita propaganda sobre esse programa, que segundo eles, demonstrava que o país evoluía, as pessoas tinham mais chances sociais e isso os ajudava a conseguir cada vez mais recursos. Poucos entendiam o que era o esquema sórdido da máquina governista, que não cumpria o seu papel básico, que era o de garantir o livre acesso a educação a todos, manipulava todo um sistema, fazia com que o cidadão, que já bancava uma carga de impostos absurdamente alta, tivesse que pagar novamente por um bem que ele já havia pago, no caso, a educação, pois o objetivo dos impostos, um deles pelo menos, era para ser investido na educação, mas esse dinheiro era desviado, ficava nas mãos de poucos e esse mesmo cidadão, que já deixava boa parte da sua renda com o governo, arcava com novos custos, comprometendo cada vez mais seu orçamento, para poder tentar uma vida melhor, que na grande maioria dos casos não dava certo.
– Nonno, acho que por hoje chega, toda essa história é muito pesada, é muito suja não estou me sentindo muito bem, creio que me desequilibrei um pouco com tudo isso. Podemos parar agora e retomar essa nossa conversa amanhã?
– Claro, meu neto, claro que podemos. Vá para sua casa, descanse, fale com amigos, relaxe e elimine essa energia densa. Eu sabia que isso aconteceria, essa parte da história é muito repulsiva mesmo. Mas se prepare, porque muita coisa ainda está por vir. Nos encontramos amanhã aqui mesmo e no mesmo horário?
– Sim, podemos, mas nonno, amanhã ao invés de ficarmos sentados, gostaria de caminhar pela natureza enquanto conversamos, porque sei que isso vai me ajudar a trabalhar melhor com essas energias.
– Muito bem, Vitor, muito bem.
Eles se despediram com um caloroso abraço e cada um foi para sua casa.